“Fábricas Triunfo, a Maior Organização Industrial do Centro do País”

A empresa “Fábricas Triunfo” teve origem na Sociedade de Mercearias Lda, fundada em 1913, na Rua dos Oleiros, em Coimbra, pelas mãos de um grupo de empresários desta cidade liderados por Mário Pais e Adriano Viegas da Cunha Lucas. Um projeto que viria a ser um dos motores de toda a região de Coimbra e que iria criar aquela que ainda é hoje uma grande referência de bolachas em Portugal.

As instalações fabris localizavam-se junto à linha de caminho de ferro, na margem direita de rio Mondego, numa base industrial ainda muito ligada à produção e ao comércio tradicional e local e à venda de produtos de mercearia e produção de farinha, azeite, vinagre e aguardente. Numa mudança de escritura em 1922, passa a designar-se Sociedade de Mercearias e Farinhas Lda, onde já se vendia farinhas e sêmeas de trigo, para além da sua vertente de mercearia. Ainda no mesmo ano, volta a mudar de nome para Sociedade de Mercearias e Fabril Lda, um passo que a inseriu na indústria da moagem e panificação, e na produção de massas alimentícias e bolachas, permitindo um grande crescimento da fábrica e aumento de produção. Em 1923 dispunha já de filiais em Lisboa e no Porto e nos anos 30, a empresa adquiria unidades moageiras em outras localidades, nomeadamente em Castelo Branco e Setúbal.

Por fim, alcança o nome tão conhecido, Fábricas Triunfo Lda, a 20 de abril de 1932, apresentando-se como um dos edifícios industriais mais notáveis da baixa da cidade, sendo composta por 5 corpos, com 3 funções diferentes: a moagem, a produção de massas e a produção de bolachas e biscoitos (figura 1).

A 8 de dezembro de 1938, a fábrica sofreu um grande incêndio que afetou a maior parte das instalações, apenas se salvando a parte da moagem, situada nas traseiras do edifício. No entanto, logo após o ocorrido, em 1939, foi iniciada a construção de uma nova fábrica no mesmo terreno, segundo um projeto do arquiteto A. Machado da D.G.E.N. e construção de A. Maia. O novo edifício, finalizado em 1940, tinha uma estrutura de betão armado e ferro, uma forma de defesa para evitar eventuais posteriores incêndios (figura 2).

Os anos 40 trouxeram grandes progressos no processo de produção, com a implementação de rigorosos controlos de qualidade e um laboratório de análises e testes na própria fábrica. Nesta altura a empresa empregava cerca de 500 trabalhadores, destacando-se pela sensibilidade e ação social e higiénica para com os seus operários.

Após este período e a aprovação do plano de urbanização de Étienne de Gröer para a cidade de Coimbra nos anos 40, a fábrica viu-se obrigada a transferir as suas atividades para a “Zona Industrial da Pedrulha” na década de 50, levando ao abandono progressivo da fábrica na baixa. A unidade de fabricação de massas, na Rua dos Oleiros, que funcionou ainda como sede da empresa, encerrou na década de 80 e em 2004 estas instalações foram demolidas.

Em 1949 deu-se então início à construção da nova Fábrica Triunfo Bolachas, cujo corpo principal apenas seria finalizado em 1953, e que se localizava na Rua Manuel Madeira, antiga Estrada Nacional nº1, Freguesia de Eiras, Zona Industrial da Pedrulha, em Coimbra.

Esta fábrica era constituída por um edifício central de caráter industrial e destinava-se à fabricação dos produtos. A fachada principal era dotada de uma torre e um grande painel de azulejos que decorava todo o conjunto. Este painel azulejar, em formato circular, do artista A. Ramos, possui a inscrição “Fábrica Triunfo - Porto - Coimbra - Lisboa” que emoldura uma imagem, de linguagem renascentista, de um cavaleiro triunfante no seu cavalo alado, inspirada na obra “Le Triomphe de l’Art” de Léon Bonnat (figura 3).

O volume junto à antiga Estrada Nacional destinava-se à receção, a salões de festa, gabinetes e ao embalamento final. Os armazéns de matéria-prima encontravam-se no corpo posterior das instalações. Foram construídos dois pequenos edifícios adjacentes ao edifício central, um deles destinava-se à central "diesel", elétrica e geradora de vapor e outro era dedicado à central geradora de gás pobre. Outro edifício foi também erguido a sul das instalações principais, destinado a serviços sociais, a um refeitório e ainda a uma garagem. A norte foram ainda construídos armazéns de descasque de arroz e ainda um infantário.

Um elemento publicitário, de 1961 – com um desenho das novas instalações da unidade de massas e bolachas da Pedrulha refere as Fábricas Triunfo como “a maior organização industrial do centro do País” (figura 4). Presente em Coimbra, e com delegações em Lisboa, Porto, Abrantes e Faro possuía, então, duas moagens e produzia massas alimentícias, bolachas, arroz, drops e rebuçados.

A implantação da unidade fabril Triunfo Bolachas em 1949, a par com a grande procura dos produtos ali produzidos e o crescimento económico da empresa, despoletou a atração de novos ramos industriais. Neste contexto surge uma nova fábrica da mesma sociedade e do mesmo setor industrial, mas de um ramo diferente que se destinava à produção de alimentos compostos para animais, vulgo rações (figura 6).


A fábrica Triunfo Rações acabou por instalar-se num terreno de geometria triangular, muito próximo do local onde já estava implantada a Fábrica de Bolachas da mesma sociedade. No entanto, estas instalações fabris tinham a vantagem de usufruir diretamente da linha de caminho-de-ferro, através de um ramal particular para o transporte da matéria-prima, o trigo, que era armazenado nos silos de cereais, localizados junto à linha. A construção desta fábrica, que se iniciou pelos silos em 1956, foi sendo alvo de sucessivas ampliações, ao longo das décadas de 60 e 70. Para além dos silos, a fábrica era composta por um imponente bloco industrial vertical, destinado à moagem, e por dois armazéns (figura 5).

Com a década de 50 a marcar um período de grande expansão, a Triunfo oferecia aos consumidores portugueses, já naquela altura, mais de 25 variedades de bolachas diferentes, entre as quais a Maria, Torrada ou Wafers.

Em 1974, as Fábricas Triunfo abrem a sua primeira fábrica em Lisboa, em Carnaxide, dedicada à produção de bolachas e massas, numa fase em que se consolidava o mercado interno e o objetivo era internacionalizar a marca.

As Fábricas Triunfo de Coimbra e Lisboa integravam, assim, a produção de bolachas, massas alimentícias, descasque de arroz e rações para animais, chegando a empregar, na década de 70, mais de um milhar de trabalhadores. Até esta mesma década as bolachas eram vendidas maioritariamente a peso nas mercearias, que as adquiriam em latas de 1,5 kg a 3 kg e que ostentavam belos e atrativos desenhos publicitários (figura 7).

A marca Triunfo foi, aliás, a primeira marca de bolachas a aparecer na televisão portuguesa. Esta presença histórica, nos principais meios de comunicação e outdoors, levou a marca a beneficiar de uma relação de grande proximidade com os consumidores (figuras 8 e 9).

A empresa viria a ser adquirida em 1994 pela Nutrinveste, holding do Grupo Mello, que passou também a deter as marcas Nacional e Proalimentar, ficando por isso responsável pela gestão de 90% da produção nacional de bolachas (figura 10). Por decisão do novo dono, a Fábrica Triunfo Bolachas de Coimbra, que empregava nesta altura 180 funcionários, encerrou a 30 de março de 2001, sendo a sua produção transferida para as instalações de Sintra, de Mem Martins (ex-Nacional).

Atualmente o cenário é de degradação e abandono total de uma unidade fabril que outrora empregava um número significativo de funcionários e partilhava o seu agradável odor com toda a área envolvente da Pedrulha.

Também a Fábrica de Rações caiu no abandono após uma última vistoria realizada em 1999 com parecer negativo, levando ao seu encerramento.

Neste contexto, a Triunfo, como líder destacada de mercado em bolachas, é identificada como a marca prioritária dentro do portfolio da Nutrinveste quer em termos de apoio publicitário, quer em termos de inovação. No final de 1999, a Triunfo lança um dos produtos mais bem sucedidos no mercado de bolachas em Portugal, as Chipmix. Uma inovação em toda a linha, quer em termos de produto e embalagem, quer em termos de comunicação – altamente irreverente para um público mais jovem.

Em 2004, a Triunfo passa a integrar o portfolio da multinacional United Biscuits, uma das principais empresas europeias no setor da alimentação, e a marca toma um novo rumo estratégico, focando-se nos segmentos Nutrição, Saúde e Tradição (figura 11). A Triunfo absorve a marca Proalimentar e lança mais dois grandes sucessos: Triunfo Digestive e Triunfo Mini Diver.


Dois anos mais tarde, em 2006, a multinacional norte-americana Kraft Foods adquire o negócio de bolachas à United Biscuits, incluindo a unidade fabril de Mem Martins e as marcas portuguesas Triunfo e Proalimentar (figura 12). O ramo português desta multinacional passa então a designar-se “Kraft Foods Portugal Ibéria – Produtos Alimentares, Unipessoal, Lda”. Nesta fase, a Triunfo reforça a sua presença no segmento Tradicional, lançando desde então vários produtos inovadores, como por exemplo, em 2011, os Mini Clássicos, um novo conceito que oferece ao consumidor as bolachas tradicionais de sempre num formato mini e numa embalagem “saco”, ideais para partilhar em família. Em 2013 a área de negócios da Kraft Foods dedicada aos snacks mudou de nome e de acionistas, passando a designar-se Mondelez International (figura 13).

Ainda em 2013, a Triunfo celebrou o seu centésimo aniversário como uma das grandes marcas portuguesas, produzindo bolachas não só para o mercado português, mas também para países onde existem emigrantes portugueses, como França ou Luxemburgo, e para as ex-colónias portuguesas, principalmente Angola (figura 14).

Em finais de 2015, a multinacional Mondelez, alegando a baixa utilização da capacidade de produção da fábrica em Mem Martins, que emprega nesta altura 92 trabalhadores, comunica a decisão do seu encerramento, com vista à deslocalização da produção para a sua nova fábrica em Opava, na República Checa.

No entanto, em março de 2016, a empresa Cerealto chegou a acordo com a Mondelez International para manter a atividade industrial na fábrica de bolachas de Mem Martins (figura 15). Este acordo contemplou a manutenção dos postos de trabalho desta unidade, assim como a venda, à Cerealto, da maquinaria e das linhas de produção de que a Mondelez International era proprietária. A operação não incluiu a venda de nenhuma das marcas da Mondelez, contudo, este contrato, previa que a Cerealto fabricasse alguns produtos para a Mondelez.

A compra da fábrica de Mem Martins foi ao encontro da estratégia de expansão internacional da Cerealto – que é a sua segunda fábrica em Portugal, após a aquisição, em 2013, à Danone, da instalação de alimentação infantil Nutriceal Foods, localizada em Benavente, Santarém.

A Cerealto é uma empresa de alimentação com uma história de mais de 25 anos de fabrico de produtos com base cereal em diversas categorias: bolachas, cereais de pequeno-almoço, alimentação infantil, pão, pastelaria, massa ou produtos sem glúten. Apoiada por mais de 14 fábricas em Espanha e um centro de referência de R&D na Europa, a Cerealto conta com centros de operação em Portugal, Itália, Reino Unido, México e nos Estados Unidos e tem clientes em mais 40 países.

Ao longo da sua já centenária história, a marca Triunfo foi sendo alvo de diversas modificações do desenho do seu logótipo, tornando-o mais moderno e apelativo. Em resultado da consulta de alguns itens publicitários da marca, apresenta-se na figura 16 uma evolução desses logótipos até aos dias de hoje.


A propósito do primeiro pacote de açúcar mostrado na pagela apresentada nas imagens, onde se refere “bolachas Triunfo, uma preferência portuguesa”, provavelmente da década de 60/70, deixo aqui também uma curiosa publicidade dada Triunfo, publicada na Gazeta de Coimbra em dezembro de 1938, muito ao estilo do Estado Novo.


Convido ainda a verem o seguinte vídeo, onde se relatam os primeiros 100 anos da história da marca Triunfo:

Partilho a pagela em formato pdf, que poderão descarregar aqui.

Fontes: 

- “Arquitetura Industrial em Coimbra no século XX - A Zona Industrial da Pedrulha”, Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitetura.; 

- “Fábrica Triunfo Rações - Reconversão de um Espaço Industrial”, Dissertação de Mestrado Integrado em Arquitetura; “Fábricas Triunfo”, Restos de Coleção em  https://restosdecoleccao.blogspot.com/2011/02/fabricas-triunfo.html


Nota: Post revisto a atualizado de um publicado inicialmente a 24 maio 2022 em https://www.facebook.com/pacoteca.acucar

Sem comentários:

Enviar um comentário

Destaque